terça-feira, 30 de novembro de 2010

Um dia ela vem...



quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Thriller movie

Quem nunca foi a uma pré-estreia, que retraia a vontade de mandar o desconhecido ao lado ficar, por um instante, quieto. O popular ‘cala a boca’ - aliás, ouvi bastante esse dizer, que ecoava aos montes na sala 5 super lotada. A cena típica: fila gigantesca, formada pelas mais distintas espécimes humanas – ou próximo disso. Disputa por pipoca e refrigerante. Cá entre nós, não há pipoca igual a do cinema. Um dia hei de descobrir a receita daquela manteiga – seria o prazo de validade vencido? De qualquer forma, a procura pelo milho estourado era absurdamente previsível.
No banheiro, a disputa pelo espelho central que, em vez de ser utilizado para que os usuários averiguassem a própria imagem, refletia garotas fazendo poses e bicos para tirarem fotos com uma câmera cor-de-rosa. “Essa ficou linda, vou por no perfil”, “Amiga! Que maravilhosa... você ficou ga-tís-si-ma!”. Minha vontade era enfiar a cabeça no vaso sanitário e dar descarga. A cabeça delas, claro. Vislumbrei álbuns em redes sociais intitulados “No xóps”, “Antes do cine” ou “Friends 4 ever”. E provavelmente acertei um desses.
Esqueci de comentar a respeito dos espécimes que aguardavam a porteira abrir. Me senti velha. Muito velha. Seria um absurdo a criançada estar fora de casa em plena quinta-feira de madrugada, ou mais absurdo ainda seria uma tia (sim, perto da creche do papai, me senti uma tia) ter comprado bilhete para a pré-estreia? De Harry Potter. E qual o problema em gostar de histórias fantasiosas e querer assistir ao filme com antecedência? Ok, uma falsa antecedência, visto o atraso para que o longa chegasse até minha cidade. Que nem é tão tão distante.
Uma fobia de estar ali no meio apoderou-se de mim. Mas enfrentei os fãs mais ousados que levavam bolsinhas de coruja – ah vá, a Edwiges é a primeira que vai pro saco – entre outras peculiaridades que possivelmente eu só pude conferir ali. Rumei até a sala. Já mencionei que meu bilhete coincidia com a primeira fileira? Sim, primeira. Eu já havia previsto um torcicolo daqueles depois da sessão pipoca. Dor no pescoço que ficou no chinelo, perto da algazarra que começou quando a tela acendeu.
Histeria. Propaganda. Mais histeria. Símbolo da Warner. Demência. Primeira imagem do filme. Inconsciência. A sala 5 estava repleta de gente desvairada. Pior ainda, deixando-me em estado semelhante. De raiva. Atores aparecendo aos poucos, personagens da minha pré-adolescência contemplados com gritos. Era a sessão terror. Thriller movie na sessão madrugada do cinema da cidade. Só não saí correndo dali aos berros por que... Eu realmente queria ver o filme.
Vou poupar meus elogios para a adaptação da primeira parte do último livro – e se você não gosta de Harry Potter, o problema é todinho seu – tudo corria bem, até a tela resolver dividir-se ao meio. Artístico, ironicamente. O sono dos lanterninhas atrasou a estabilização da tela, que veio após alguns minutos de meia-tela e urros dos estressados. Credo gente, estresse desde cedo cria rugas. E cabelos brancos. Com a suposta normalidade, achei que já tinha acontecido de tudo. Voltar para casa antes das três era missão impossível até então.
Não. Pausaram o filme, como se fosse um DVD alugado para assistir no aconchego do meu sofá. E voltaram até a parte em que o maldito corte resolveu roubar a cena. Respirei fundo, observei os cidadãos levantarem das cadeiras, remexerem-se, abusarem um pouco mais da voz. Vamos rever a cena. Tudo bem... Era uma parte que eu havia elogiado, a ideia ficou muito boa. E vi de novo, sem fôlego para reclamações.
Tensão, tristeza, ação. Ouvi soluços e narizes. Choro. Os créditos começaram a rolar ao som da típica trilha sonora e esperei a luz ficar acesa para que pudesse me retirar sem correr o risco de tropeçar no meu próprio all star – o que não seria de se estranhar. Nada de luz se acender. Atípico. Arrisquei-me andar até a luz no fim do túnel e tentar sobreviver nesse breve espaço de escuridão e gente se embolando. Comentários audíveis do filme. Eu queria de novo. O filme, somente o filme.
Desci as escadarias do shopping, conversando com alguém que realmente entendia minha indignação. Entre xingamentos, pérolas e exclamações sobre o que acabávamos de vivenciar, a conclusão era óbvia – diferente da noite:
- É isso que dá vir em pré-estreia;

Mutação

A gente teima em modificar o que está cômodo. Mas a verdade é que a mudança nos faz bem, pelo menos se propõe a fazer. Não há alterações que não venham, seja por dor ou por necessidade, fazer-nos crescer. Refletir. E mudar.
Há quem se entedie muito fácil, e os que se contentam com pouco. Os que nada buscam e os que em tudo crêem. Desenvolver faz parte. Optar também, mesmo que seja impossível explicar algumas escolhas. Por impulso. Criar situações, definir rumos, alimentar expectativas e, vez ou outra, dar de cara com a decepção.
Se decepcionar também faz parte. Faz crescer, da maneira mais difícil, é verdade. Mas faz, simplesmente. Passa o tempo e quando vês, sedimentamos o que por hora sentimos. Atamos as mãos, cruzamos as pernas. Arremessamos da janela em vã tentativa de viver. Antes que alguém nos atire. Externe.
Revolta. Preciso dizer que compõe a vivência? Transforma por si só, a pessoa que assume outra personalidade. Na esperança de funcionar. A revolta vai embora, as cicatrizes ficam. E muda-se.
Uma hora cansa. E cansamos de cansar e permanecer cansados... Daí vem o tempo, as acusações e o tédio, fazendo com que a ideia seja substituída. Não adianta. É impossível não mudar.

(Ok, preciso de inspiração. Ur-gen-te. Alguém se habilita a tomar um café?)

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Aleatório

- O problema é que a gente quer sempre antecipar tudo;
- É verdade, a Rosane sempre diz que eu adoro pôr o carro na frente do boi;
- Mas eu não consigo...
- É que a gente pensa lá na frente...
- Aham
- E deixamos de pensar no agora... Porque o agora já foi pensado lá atrás.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

É o primeiro dia do resto da minha vida

Um contra-senso. Acabou por inverter a história. Quando pequena, deitava-me e, religiosamente pedia que minha mãe contasse alguma história. Tinha adoração por Chapeuzinho Vermelho e os Três Porquinhos. Gostava ainda quando ela resolvia, de muito bom humor, inventar alguma narrativa. Ingratidão a dela ao me levar a um lugar chamado escola. Deu-me opções: a pública e a particular. Na cidadezinha onde morava, a última garantia os mimos de cadeirinhas e mesinhas coloridas. O que de nada adiantou, de colorido eu me bastava com minha caixa de Faber-Castell com divinas 48 cores. Optei por mesas e cadeiras normais. O primeiro dia, não esqueço, a novata. Mil rostos fitando-me dos pés à cabeça – não que houvesse muito espaço entre um e outro. Era o ápice da minha meia dúzia de velas assopradas.

Um pecado, largar aquele projeto de gente à mercê da professora e de um batalhão de curiosos. Ainda lembro-me da primeira pergunta: “Você tem cachorro?”. Tinha. A Kika, que infelizmente perdera a vida em um incêndio. Mas não vem ao caso, afinal, o choro entalado na garganta resolvera anunciar a chegada de mais convidadas: lágrimas e lágrimas rolando pelo meu rosto – que nunca imaginara receber, futuramente, visitas periódicas da tal de Acne. Enfim. Chorei. Chorei. E passei as horas seguintes em uma salinha especial. Não entendia porque a salinha era especial e, anos mais tarde, descobri o que era síndrome de down - a rima forçada não fora de propósito, perdão. Todos tinham direito de aprender, e eu, obviamente, de chorar.

Desesperada ao ouvir o que a diretora relatava. Que conduta terrível da menina, anti-social. Fechamos um acordo com a bibliotecária: eu iria me juntar aos outros de mesma idade, à contra gosto, mas a oferta era válida. Poderia dali em diante, emprestar quantos livros eu quisesse daquele lugar mágico que me acolhia tão bem. Meus primeiros passos na literatura, quem sabe. Sorte minha que consigo lembrar, ainda em detalhes, do pior dia da minha vida. Esbaldava-me em casa com tantas figuras de coelhinhos, ratinhos e bonequinhas. E dizeres curtos, porém, tão significativos.

Hoje, ironicamente, me peguei lendo crônicas recém adquiridas para minha mãe. Antes de dormir. Nada comparado a chapéus ou porcos. Quiçá, camelos e agulhas, aniversários de crianças ou domingos de sol. E, de muito bom humor, entoava algo que anos mais tarde viera a aprender a gostar e escrever: crônicas. Hora de contar histórias e dormir.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

A saudade prevalece

2 de novembro. Finados. Cemitério Municipal de Maringá e alguns cliques.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Eu não me importo

O frio gela até a alma, se é que ainda a tenho, se não a vendi em um desses dias de fogo. Sabe que para esquecer a vida, se é que posso chamar isso de vida, doses e mais doses de álcool acalentam qualquer coração congelado. Alzheimer momentâneo, fuga passiva. E o efeito teima em passar cada vez mais depressa. Tentei outras coisas mais pesadas, que prolonguem o efeito de minha ausência terrena, mas careço de ter doses ainda maiores de cada substância dessas. Dilacera-me aos poucos. Por ninguém se importar, eu não me importo.

Pesco algumas lembranças que boiam na memória já diluída pela falta de oportunidade. Ou falta de vontade - não serei negligente com minha própria situação. A barba volumosa fornece a prévia dos dias em que não vejo um chuveiro. Um espelho. Os hábitos asseados que um dia já tive. Mal consigo lembrar aquela época, hoje distante, apagando-se gradativamente. Já não faço perguntas, não quero respostas, evito prolongar o raciocínio. Mantenho o corpo inanimado ainda bombeando sangue. Veneno que mantenho minhas angústias em quarentena. Pertence que não posso doar vender ou mesmo liquidar. O sangue ainda me deixa vivo o suficiente.

E percebo, com certa dor, que diferença nenhuma fiz. Que deixei a lacuna da minha vitalidade vazia. Enterrei-me na vala que eu próprio me dispus a cavar. Sem casa, família, identidade ou história. Não lembro e, pior, ninguém mais se lembra quem eu era, sou e, quem sabe com alguma clemência, serei. Cansei de albergues, de agir e ser tratado como animal. Cansei do teto onde moro ser tão bipolar: hora faz sol, hora cai um pé d’água. Cansei de respirar fumaça de automóveis, de ver miséria, de perceber que minha ignorância atou-me à inutilidade. Que a preguiça e falta de perspectiva nocautearam meus sonhos que não consigo recordar quais eram. O oco dentro de mim não pode informar se sou pai, filho ou simplesmente humano. Apenas sou, existo. Sei disso porque penso, critico. E só sei criticar, nada mais.

Meus dentes batem uns aos outros, o clima sugere outra mudança na temperatura. Capaz, em plena primavera. É o caos. Enrolo-me nos trapos que ocupavam o guarda-roupa de alguma alma supostamente caridosa, que o esvaziou e diz ter feito boas ações. O vento intenso faz com que meus olhos permaneçam semicerrados. Meus cabelos desgrenhados não conseguem se embaraçar mais. Abraço meus joelhos, aperto meus braços repletos de feridas, picadas. Tateio os bolsos. Nada. Não tenho mais condições de manter os vícios, minha salvação. Relutei até fechar os olhos. Frio é psicológico. Frio é psicológico. Frio é psico...

"O coordenador do pronto-socorro de Mandaguari, no noroeste do Paraná, Eron Rodrigues Barbiero, confirmou hoje a morte por hipotermia de João da Silva Oliveira, de 40 anos, ocorrida durante a madrugada, em frente a um bar. Segundo Barbiero, ele teria saído de casa para beber bebida alcoólica, o que fazia com frequência, e acabou passando a noite na rua. A vítima foi encontrada sem agasalho. Barbiero disse que Oliveira não tinha patologia crônica que pudesse levá-lo à morte, por isso o atestado confirmou a hipotermia. O município de Mandaguari fica próximo de Maringá, onde o Instituto Tecnológico Simepar registrou temperatura de 6,5 graus positivos durante a manhã de hoje."

Agencia Estado, atualizado em 14/7/2010 às 17h10